Os altos e baixos do mercado imobiliário em 2023... até agora.

Os altos e baixos do mercado imobiliário em 2023... até agora.

Estamos em Agosto de 2023 e, mais uma vez, as incógnitas e problemas que assombraram os últimos 4 anos da atividade imobiliária em Portugal não parecem estar a atenuar-se. Aqueles que se podem gabar de ganhos e vantagens competitivas são apenas uma pequena parte do mercado, e isso não é bom. Contudo, a esperança é a última a morrer, e muitos já olham para 2024 como o ano em que, finalmente, o mercado da habitação e da mediação imobiliária entrará num patamar de estabilidade. Será?

O meu 1º Semestre de 2023

Para mim, os meses de Junho e Julho foram meses de liderança entre quase 3.000 consultores da KW PortugalQuando tudo apontava para um semestre difícil tal acabou por não se concretizar no que me diz respeito. Este foi sem dúvida o meu melhor semestre de sempre e Junho, Julho e Agosto os melhores meses de atividade da minha carreira imobiliária, curta, mas já com 7 anos.

Em 2023, tal como já acontecera no passado durante os 3 anos de pandemia e confinamentos, a diversificação da minha carteira de imóveis revelou-se mais uma vez como um elemento-chave de sucesso. Este ano, o segmento alto e de luxo tem estado em alta e contribuiu para atenuar os efeitos recessivos das dificuldades no acesso ao crédito à habitação. Obviamente, isto é uma consequência da atratividade que Portugal tem para compradores estrangeiros.

Para mim, os meses de Junho e Julho foram meses de liderança entre quase 3.000 consultores da KW Portugal. Foi assim, que atingi novamente o 1º lugar no Top Individual Acumulado, até Julho de 2023. Esta é uma conquista que tenho a felicidade de alcançar, de forma continuada, desde 2017.

Balanço da atividade imobiliária em Portugal no 1º Semestre

Após a Covid, surgiu a inflação, à qual se juntaram outras dificuldades que vieram piorar o clima da atividade imobiliária e o acesso à habitação, nestes últimos 7 meses:

  1. A escassez de oferta, tanto no mercado de venda de casas novas como no mercado de nova construção, contribuiu para manter os preços em alta. Não sendo uma tendência recente, os anos de vendas elevadas entre 2016 e 2019, muito devido ao turismo e aos compradores internacionais, e a que se juntou uma quebra muito significativa na construção de novas casas na última década, contribuíram para essa escassez.
  2. O mercado de arrendamento está pelas ruas da amargura. Lisboa é uma das cidades mais caras para arrendar uma casa em toda a Europa! Preços altos que se devem à escassez de oferta e à rigidez do mercado, agravada pelas novas regras de congelamento das rendas e pelo arrendamento de imóveis devolutos, o que trouxe desconfiança aos proprietários e investidores.
  3. A escalada de subida das taxas de juro do crédito à habitação, que se iniciou em Março de 2022 (espoletada pela guerra da Ucrânia), não parece ter ainda terminado. As taxas Euribor estão em máximos desde 2008. Desde Fevereiro de 2022, o BCE já procedeu a 8 subidas consecutivas das taxas diretoras. Passados 16 meses, a prestação do crédito à habitação mais do que duplicou e novas restrições no acesso ao crédito dificultaram a atribuição de empréstimos para compra de habitação, com maior impacto nos casais mais jovens.A escalada de subida das taxas de juro do crédito à habitação não parece ter ainda terminado
  4. A falta de mão-de-obra e a inflação agravaram os custos no sector da construção e trouxeram novos desafios a quem pretende construir uma nova casa ou renovar uma já existente. Este é um sector em que mais de uma década de emigração de profissionais qualificados, falência de empresas neste setor, a que se somou o impacto da pandemia, mudou o panorama e obrigou ao recurso a imigrantes, muitos deles sem a experiência necessária.
  5. O ambiente fiscal desfavorável não é de agora, mas tem um impacto significativo na formação dos preços da habitação. Em relação ao preço final de venda de uma casa nova, 30% desse valor (ou mais) vai para o Estado, sob a forma de impostos e taxas!

Poder-se-ia dizer que estão reunidas as condições para uma inflexão do ciclo venturoso no setor da mediação imobiliária, com um agravamento previsível das condições de acesso à habitação. Os diagnósticos estão feitos há muito; urge tomar medidas ao nível governativo que contrariem esta realidade.

E o futuro? A Deus pertence...

A esperança, para já, centra-se no novo Pacote Mais HabitaçãoQuestões religiosas à parte, a esperança, para já, centra-se no novo pacote Mais Habitação, que acabou de ser vetado pelo Presidente da República (PR), após ter sido aprovado no parlamento. Contudo, o governo vai devolver o pacote legislativo à Assembleia da República, com a aprovação final garantida pela maioria absoluta do PS. Considerando que este pacote já foi descaracterizado com sucessivas alterações, era expectável que o Governo introduzisse algumas mudanças no decreto-lei, de modo a acautelar as críticas do PR. Mas não, será submetido e aprovado tal como está.

Na minha opinião, este pacote legislativo apresenta algumas vantagens e desvantagens com impacto previsível. Afigura-se-me que o balanço será negativo, a curto médio prazo e acima de tudo não será capaz de mudar significativamente o panorama atual.

Principais Vantagens:

  • Proteção dos atuais arrendatários, minimizando o impacto da inflação na atualização do valor das rendas (prevê-se que em 2024 exista um limite entre 2 e 3% das rendas em vigor, abaixo dos 8% inflação), impedindo assim a espiral de crescimento nas novas rendas. Por outro lado, a renda dos novos contratos de arrendamento não poderá ser superior a 2%, relativamente ao valor da renda mais alta praticada nos 5 anos anteriores (independentemente de se tratar de um novo proprietário).
  • Benefícios fiscais para as famílias. Aumenta o valor do desconto no IMI que as câmaras podem atribuir aos residentes, em função do número de dependentes. A dedução aumenta para 30, 70 e 140 euros, nos casos de um, dois, três ou mais dependentes, respetivamente. Adicionalmente, os senhorios passam a pagar uma taxa de IRS de 25%, face aos 28% anteriores (caso não optem pelo englobamento dos rendimentos).
  • Agilização dos despejos em caso de incumprimento. São várias as alterações para facilitar o processo de despejo, caso um arrendatário não cumpra com o pagamento da renda, nomeadamente através do novo Balcão do Arrendatário e do Senhorio.
  • "Simplex do Licenciamento" com vista à simplificação, celeridade e desburocratização dos procedimentos urbanísticos com forte impacto na construção, alteração ou ampliação de casas, acelerando prazos e simplificando processos.
  • A vontade expressa de aumentar o número de imóveis do Estado afetos ao arrendamento, a preços acessíveis de 2% para 5%, o valor médio de outros países europeus. 

Principais Desvantagens:

  • Alguns dos benefícios atribuídos às famílias em matéria de arrendamento são feitos à custa da quebra de rendimentos dos senhorios, o que introduz uma grande penalização e desconfiança neste setor, levando a uma diminuição da oferta e aumento no valor das rendas. Este sentimento fortaleceu-se ao longo deste semestre, após o anúncio e discussão pública destas medidas, com muitos proprietários a optar por não renovar contratos anteriores, preferindo colocar os imóveis à venda. Os resultados estão à vista: quando coloco uma casa para arrendar no mercado, esta é arrendada em escassos dias, dada a escassez de oferta. Recebo pedidos de interessados, nacionais e estrangeiros, a "suplicar" que "reserve o imóvel até visitarem ou viajarem para Portugal", bem como propostas acima do valor pedido.
  • O arrendamento coercivo de casas devolutas (cujo formato mudou desde que foi anunciado) é uma medida que, embora enfrentando a oposição de muitas câmaras municipais (que já sinalizaram que não irão recorrer a ela), gerou alarme no mercado de arrendamento com impacto difícil de prever. Esta medida tem um prazo de 5 anos.
  • Benefícios fiscais à reabilitação urbana terminam para fundos de investimento. É uma medida de equidade fiscal, mas antecipa-se que tenha um impacto negativo na atração de investimento e na requalificação urbana.
  • O Arrendamento Local (AL) é um dos setores mais prejudicados por este pacote legislativo. Desde a contribuição extraordinária sobre o AL, passando pelo cancelamento das atuais licenças que não comprovem atividade recente, a reapreciação dos registos de alojamento local, à suspensão de novas licenças de AL (exceto no interior do país), até à necessidade de aprovação unânime do condomínio para atribuição de novas licenças. Não se antevê que os proprietários de imóveis afetos ao AL decidam mudar para o arrendamento de longa duração, ou os vendam ao Estado, tal como o Pacote Mais Habitação antevê. Mais facilmente os venderão ou recorrerão ao mercado informal de arrendamento de curta duração, como já atualmente acontece.

Em suma, a montanha pariu um rato e este Programa Mais Habitação, em vez de conseguir aglutinar forças, dividiu e gerou perda de confiança por parte dos proprietários, investidores, promotores privados e profissionais do setor. Quase todos, exceto a população mais carenciada ou as famílias em risco de incumprimento, parecem aplaudir este pacote legislativo. Ou seja, em vez de criar condições para normalizar o mercado da habitação, fomentando o arrendamento e dinamizando o setor da construção de novas casas, gerou controvérsia e criou desconfiança nos parceiros privados. Confundiu o plano da assistência social (da responsabilidade do Estado) com o plano da atividade imobiliária e económica (maioritariamente da responsabilidade dos operadores privados).. 

Oráculo Imobiliário ;)

Até ao lavar dos cestos é vindima!"Até ao lavar dos cestos é vindima", lá diz o povo. Apesar do primeiro semestre do ano ser habitualmente o mais forte, o impacto da subidas das taxas de juro continuará a ser a variável com maior peso na evolução do mercado imobiliário. Face ao referido atrás, as minhas previsões apontam para a continuação da atual crise no setor, que só não será mais grave devido ao interesse de muitos estrangeiros em comprar e arrendar casas em Portugal. A estes juntam-se muitos portugueses que emigraram e que agora possuem meios financeiros e interesse em investir no seu país de origem. Há também uma onda de imigrantes, principalmente do Brasil, que vieram para trabalhar e ficar e que procuram ativamente casas para residir em Portugal.

Quanto ao principal problema, a escassez de casas novas a preços acessíveis, não estou muito otimista. O Governo não aceitou o pedido de muitos Municípios para a conversão de terrenos rústicos em urbanos, no perímetro das principais áreas urbanas, nomeadamente na AML. E sem terrenos a preços mais baixos, e sem uma reforma fiscal que reduza os custos de construção e comercialização, muitos promotores continuarão a preferir a aposta em empreendimentos de segmento alto, direcionado a compradores estrangeiros e investidores em imóveis de luxo.

Apesar destas nuvens negras no horizonte, as medidas relacionadas com a dispensa de licenciamento administrativo a favor da construção com informação prévia poderão ter um impacto positivo na construção, alteração ou ampliação de casas, nos casos em que exista plano de pormenor, loteamento, quando esta disponha de desenho urbano e programação de obras de urbanização e edificação, ficando essas construções isentas de qualquer controlo preventivo. O governo nomeou um grupo de trabalho com o objetivo de avançar com o chamado "Simplex do Licenciamento", após a recente aprovação do Projeto-lei 77, e que visa a simplificação dos licenciamentos urbanos, entre outras medidas. Esta é uma alteração legislativa com forte impacto na construção de novas habitações e que envolve a revisão de cerca de 2000 diplomas legais e mais de 300 regulamentos municipais, do RGEU-Regulamento geral das edificações urbanas que remonta a 1951, do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE) e do Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT). Não se adivinha uma tarefa fácil, até pela oposição já manifestada pelas ordens profissionais e pela Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), mas parece-me uma medida positiva, há muito desejada e em linha com o que já se faz noutros paises europeus.

Esta escassez de oferta manterá o impacto negativo no setor da mediação imobiliária, levando ao encerramento de muitas pequenas agências e ao abandono da carreira por muitos profissionais que trabalham neste setor, trocando a instabilidade em que operam por outras carreiras com rendimentos mais previsíveis. Era algo já antecipado, pois o número de 50.000 trabalhadores registado no INE é claramente excessivo face à realidade do setor em Portugal.

Em relação aos preços, teremos cenários distintos.

  • No mercado de nova construção, não se antecipa qualquer queda de preços. O aumento dos custos, apesar da estabilização da inflação, bem como a escassez de oferta, permite aos promotores manter preços altos, especialmente em áreas do país com maior procura: arredores de Lisboa, Porto, Oeiras e Cascais, Madeira e Algarve.
  • No mercado de casas usadas, antecipo que exista uma tendência de estabilização dos preços ou até uma descida, especialmente nas zonas menos valorizadas, ou onde os preços já tinham atingido patamares muito elevados face ao poder de compra dos interessados.
  • No mercado de arrendamento, face à escassez de produtos e tendo em conta o atual clima de desconfiança gerado pelo Pacote Mais Habitação não se adivinham melhoras, antes pelo contrário ;).

Em síntese, os próximos 12 meses continuarão a ser difíceis para o setor imobiliário e para o acesso à habitação. Se a economia global continuar a crescer e não houver qualquer evento imprevisto a perturbar os mercados, acredito que em 2024/2025 o mercado retome alguma estabilidade, mas ainda a patamares inferiores ao que estávamos habituados, até 2019. E só com o lançamento de novos programas habitacionais, com a colaboração de autarquias e promotores privados, e com a descida das taxas de juro é que será possível atingir uma oferta de casas a preços mais acessíveis para os portugueses.

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